2019/03/31

Para a Graça e para o Sidónio


Em tempos de dor e luta no seio da família dos meus amigos Graça Sampaio e Sidónio Violante
(comentário que deixei no blog ´picosderoseirabrava` da Graça e que me permito transcrever aqui) 



Graça-Sidónio

O rumo de cada vida,
pensamos alguns de nós,
já está determinado
antes mesmo de ser.

Ainda bem que nós 
não temos o dom da antevisão.

Mesmo assim,
quando somos confrontados
com os momentos dolorosos
que nos tocam em todos os sentidos,
não há forma de fugirmos
à sensação terrível de impotência.

Ainda bem que temos,
apesar de tudo,
a força interior de aceitar,
em conformidade com a Lei Geral
e abstracta do Cosmos.

Ainda bem 
que também temos
os nossos amigos 
Presentes. 

Mesmo que pela mera corrente contínua do pensamento…


AntónioNunes
Leiria, 31-03-2019


ps.: 
O Sidónio morreu em paz hoje, soube poucas horas depois de ter escrito este texto.
Tinha 72 anos. Que repouse em Paz, como bem merece. Condolências sentidas
 à família.

2019/03/30

A pretexto da apresentação do 26º livro de poesia de Carlos Lopes Pires: «aquele que não ouvirás mais»


No decorrer dum jantar com muitos e bons amigos, em Leiria, a pretexto (há que arranjar sempre um pretexto para se juntar os amigos à volta duma mesa a comer, a beber e a conversar) do lançamento do 26º livro de Carlos Lopes Pires, foi-me dada a oportunidade de dizer umas coisas para que ficasse registado o momento, que era de convívio e regozijo por mais um livro que foi dado à estampa pelo autor.
(Li vários fragmentos deste texto, penso que a partir de "Assim"...)
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Palmilhar a luz

De há uns tempos a esta parte, mais precisamente desde que nos conhecemos nos Serões Literários das Cortes, que tenho dado comigo a constatar que a poesia de Carlos Lopes Pires é, também para mim,  algo de transcendente, que nos transmite uma sensação complexa de simplicidade com que devemos encarar os vários aspectos e momentos da nossa vida.
Ao lermos os seus poemas somos transportados para uma dimensão que não julgava tão acessível ao comum dos mortais.
Quando se fala de Poesia poderemos, talvez, encará-la sob três aspectos:
1) O autor, acima de tudo, escreve, observando regras quase matemáticas de métrica e rima;
2) O objectivo do que se escreve é passar uma mensagem de eloquência e de cultura primorosa em todas as áreas do saber e do estar, na literatura inclusive;
3) Um poema não tem de obedecer a nenhuma forma específica nem abordar temas e questões concretas, explicitando ao leitor o que se julga que ele deverá interpretar da linha de pensamento do seu autor.
Parece-me cristalino que a poesia de Carlos Lopes Pires só pode ser enquadrada no ponto 3 anterior, ainda que ele não precise que lhe seja atribuído nenhum rótulo. A Poesia para Carlos Pires é precisamente aquilo que nos tem deixado ao longo dos anos, e, particularmente neste seu 26º livro publicado, “aquele que não ouvirás mais”.
Não quero nem me devo alongar nesta minha singela intervenção, mas não podia deixar de referir aqui e agora dois pormenores decisivos que poderão justificar o tempo que vos estou a tomar.
Assim:
Todos nós temos altos e baixos no entusiasmo como encaramos a leitura e apreciação do que se vai escrevendo na área da Poesia. Acontece até que frequentemente nos inquirimos sobre o que é de facto a Poesia de que tanto se fala ultimamente. A verdade é que muito se está a escrever a pretexto de que se trata de poesia e ficamos naquela indecisão de sabermos se a poesia é ou poderá via a ser, algum dia, enquadrável num formato dito literário. Devemos integrar a Poesia na Literatura, nos precisos termos em que tradicionalmente esta se entrincheira?
É dos compêndios académicos e da tradição clássica que a poesia é a mais antiga das formas literárias. No entanto não será a Poesia muito mais que uma forma por que a Literatura se manifesta? Não deveremos nós alargar a ideia de Poesia para além do mero uso da palavra com que se constroem textos literários?
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Está à vista de quem me estiver a ouvir que eu não sou a pessoa indicada para dissecar esta temática.
Permitam-me, no entanto, evocar algumas reflexões que o nosso querido amigo e poeta Carlos Pires já deixou escritas e à nossa disposição.
Diz Carlos Pires num seu texto de 2017 acerca de Poesia, começando pelo título: «Poesia: a revelação iluminada.»
Prosseguindo: “A poesia diz o que não pode ser dito, revela o segredo e, embora este escape, a poesia  deixa no Mundo e no Outro a marca desse segredo e desse mistério.”
“Por ser um olhar de espanto iluminado ele é e traduz no poeta esse estado de encantamento, talvez de epifania ou simplesmente de revelação iluminada. É por isso que toda a poesia tende para o misticismo (ou religiosidade ou transcendência). Em grande medida creio que a poesia pode ser entendida como um diálogo, uma ligação com o Universo.”

Há que ler com atenção este texto.

Tenho que o dizer agora, não me considero um poeta na acepção tradicional/convencional do termo, mas estou a dar comigo a ensaiar a escrita de poesia – pretenciosamente, talvez – sentindo que a mensagem de Carlos Lopes Pires me está a cativar sobremaneira.
O seu estilo e forma de encarar o Homem/Natureza  integrado no todo Universal estão a conseguir ser, para mim, como que uma trave mestra do edifício poético que eu imagino.
Por isso mesmo já me habituei a admitir a sua dimensão de Mestre e a minha qualidade de mero discípulo aprendiz.

Era só isto que eu queria dizer, que me sinto como que a palmilhar a luz rumo ao indefinido e com a intenção de aproveitar os anos que me poderão restar de ser terrestre para continuar com os meus ensaios poéticos nas abertas do tempo e do espaço em que me for possível situar.

Obrigado, Carlos, pela Mensagem que nos estás a conseguir transmitir duma forma decidida e contundente sob o rótulo da complexa e aparente brevidade do teu discurso poético.

Leiria, Museu do Papel e/ou Casa do Zé Manuel (S. Romão), em 23 de Março de 2019
António dAlmeida Nunes

2019/03/29

quem seríamos nós



Enquanto o tempo voa

ao ritmo dos pássaros

ao sabor das ondas
        [sob o olhar penetrante dos peixes
no movimento imperceptível
        [da Areia Branca da praia

e na força incrível 
        [que advirá da fusão
        [dos átomos da rocha

extasiamo-nos
até ao azul do horizonte
com o que conseguimos
ver


quem seríamos nós
se víssemos para além
do que vemos ¿

aDa-28mar19
Areia Branca-Lourinhã
(com o pensamento também na família Vasconcelos)

2019/03/26

Tenho o privilégio supremo de ter um quintal que também é jardim


Em Julho de 2017 escrevi este poema, penso que para ser dito no decorrer do «Poetry Slam - Leiria» que se realizou cá em casa.
Não o encontrei publicado neste meu blogue, no verbete "Poesia(ensaios)".
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Tenho o privilégio supremo
de ter um quintal
que também é jardim

nele vivemos com
muitas flores e árvores
envoltas em cheirinhos
de jasmim
flores de laranjeira
alecrim

risos de quatro gerações 

e muitos pássaros
alguns que acabam
nas garras e dentes dos gatos

estes dias têm sido de pintassilgos
todos os anos fazem ninho
em sítios diferentes
ora no aloé grande
ora na fiteira a poente

só pode ser obra tua ó Deus

Deus queira que
aguentes tanta canseira
... para todo o sempre!...

Jul17
an



2019/03/23

Oração à luz ao rio e aos peixes




Oração à luz ao rio e aos peixes

Ó água do rio

Tu que és movida
pela força da gravidade
e pelo movimento
dos peixes

Tu que digeres
toda a imundice que há
até mesmo os plásticos
imperecíveis
e de todas as origens
ainda que as mais nobres

Tu que tanto te esforças
com os peixes em alvoroço
por entre montes e canaviais

Tu que és a casa mãe
de todos os pássaros
e de todos os peixes
mesmo os do mar

de toda a sabedoria enfim

Tu que és capaz de rolar
e esmerilar a pedra mais dura

Faz com que:

da noite do obscurantismo
se faça dia
da sombra das tuas profundezas
se faça luz

os peixes possam respirar
fora de ti
e assim consigam ouvir
as nossas pregações

Não há outra via
do mundo de todos os mundos
ser salvo

Só assim
a luz nos poderá
Iluminar o caminho
que temos que palmilhar
seguindo o farol
dos ensinamentos vertidos
em todos os versículos
e outros textos literários
do Grande Livro da Sabedoria 

Assim seja para todo o sempre
e até mesmo
depois de chegares ao Mar
Ó Rio-Mar

Leiria, no Museu do Papel e no Zé-Pato
em 23 de Março de 2019
António dAlmeida Nunes

2019/03/16

O meu pai Daniel aos 95 anos feitos em 13 março de 2019



Olá meu pai
95 anos são passados
desde que chegaste (...)
àquela memorável e mítica
terra do Casal de Ribafeita
a casa da avó tua mãe
ficará para sempre
envolta naquela bruma
de saudade e nostalgia
que o tempo não dissipa
para sempre tu serás lembrado
recordas-te daqueles tempos
das nossas idas ao Casal
eu uma criança de olhos azuis
cabelo ligeiramente ondulado
ao jeito da mãe, talvez?
- ó Daniel é o teu filho?
- está crescido o rapaz!
tantas recordações:
aquela ida à Carvalha
pedras graníticas monumentais
a serra logo acima
e aquele ataque de vespas
na portela
zangadas por lhes tocarmos na oliveira?
tu a defenderes-me como se
estivéssemos a ser bombardeados
a II guerra ainda na mente
e a rua central do seixo
no Porto
os montes caulinos ao longe
uma brancura esfumada no horizonte?
e o instituto na rua de entreparedes
o exame de cálculo financeiro
o humanismo impagável do director
a fé da mãe ... ?
a Fundação Calouste Gulbenkian
e a avó Caria
que esperou pelo meu regresso
de Moçambique
para morrer?
os meus irmãos...
...
antónio d´almeida nunes
13 de março de 2019

a tentar perceber



a tentar perceber
a razão de tanto movimento
de abelhas
no meu quintal

Deus lá se dignou
enviar-me um mensageiro-apicultor
invectivando-me
pela minha Santa ignorância:

- então tu meu safardana
  septagenário do planeta Terra
  ainda não sabes
  que o tempo dos enxameamentos
  é chegado?!


ganha lá juízo
  e trata-me bem desses deuses
  imprescindíveis ao vosso sustento
  abre-me esses olhos


respondi com um simples olhar para o azul


ada
13mar2019

2019/03/14

Primavera em 2019 ainda antes do calendário




A dificuldade de escolher e conciliar tanta fotografia com a poesia de Carlos Lopes Pires e a música de Pedro Jordão. 14-03-2019 após uma pequena sessão fotográfica num jardim dos Lourais - Leiria-Portugal numa tarde esplendorosa de luz, cor, sol....

2019/03/12

Começar com abelhas




Há dias assim
Acorda-se num limbo
De cores inquisidoras
Tendentes para tons cinza

Começa-se com abelhas
Sem se saber que o são
Fica-se logo com a ideia
Dum enxame de coisas insolúveis

Tenta-se falar com o mundo
A pedir respostas sábias

Afinal o enxame
É mesmo de abelhas
Elas próprias a precisarem de ajuda

Talvez que o apicultor
Consiga convencer a rainha


ada - 12mar19

2019/03/09

Este pessegueiro especial




há amigos para sempre
mesmo que
a sua amizade seja cíclica
porque assim 
Deus determinou 
talvez um dia
este pessegueiro
se lembre de mim
da abelha que o volteia
e da formiga eusocial
- de quando nós
  éramos

ada-8mar19

2019/03/06

à espera do jasmim




Enquanto a ´Laura`
com chuva e vento 
amarelo/laranja 
se manifesta de Sul
Sudoeste e Oeste
lá fora

de fora para dentro de casa
esta rosa  corajosa
espreita    airosa

e espera
ansiosa
pelo jasmim


ada
6mar19

2019/03/03

Um pessegueiro encantado por um canário




   (fundo preto: alcatrão da minha rua. Foto tirada de cima do telhado da casa)


sou aquele pessegueiro
que  num quintal mora
nos Lourais

até agora
só pouso de pardais

a doença e a melancolia
que me têm apoquentado
desde que aqui fui plantado
longos anos já passados
não me têm permitido
criar pêssegos
como está determinado
que assim deva suceder

e pergunto
se há algo de errado
comigo

reparem na minha floração

será que este ano 
eu vou dar pêssegos ?


aDa
pp do pessegueiro

2019/03/01

e nós enquanto somos







imagens envolventes
lonjuras que nos prendem
caminhos e árvores
e silhuetas dos montes
sugerem-nos paragens
muito para além 
do nosso olhar
e nós
enquanto somos

.
adalmeidanunes
27-02-2019