Ainda na sequência dos ´posts` anteriores, a propósito de buscas na internet sobre Acácio de Paiva, eis que me deparei com este artigo delicioso sobre o glorioso BENFICA (temos que convir, sejamos ou não adeptos do SLB). Originalmente está publicado no blogue "O Indefectível" no link
e foi escrito pelo meu primo, por afinidade que seja, Afonso de Melo, bisneto de ACÁCIO de PAIVA, por ser filho da neta Constância Paiva. Convém que se acrescente que veio parar àquele blogue por via de "O Benfica".
Estando seguro que o meu primo não se vai zangar com esta minha liberdade, aqui republico esse artigo histórico e brilhantemente evocador da origem de entusiasmo e de paixão do SLBenfica. Para que conste neste blogue dum viseense/portuense, tão leiriense como os que o são e Benfiquista desde sempre. E que tudo tem feito para que o nome do "Altíssimo Lírico e o Maior Humorista da Poesia Portuguesa", ACÁCIO de PAIVA, se mantenha vivo. Como bem merece.
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Os jogos entre Benfica e Sporting voltaram a estar na moda.
Talvez por razões menores que o tempo reduzirá à sua verdadeira dimensão. E se
alguém julga que estes são dias conturbados, regressemos aos primórdios para
comprar realidades incomparáveis.
antiga Marcolino Bragança
Os jogos entre Benfica e Sporting parecem estar de novo na
moda.
Moda por moda, deixemos as modinhas mal ajeitadas dos
bate-bocas de mau gosto e vamos dar uma volta a tempos que lá vão. E como
vão...
O livro de Júlio Araújo, «Meio-século de Futebol
(1888-1938)», é um grande repositório da realidade da primeira década do Século XX. Também nos socorremos
dele para ir tentando ficar com uma ideia clara de génese desta rivalidade que
marcou até nos dias de hoje a vida do País. Nada como ir beber água fresca da
mais pura das fontes.
Orgulhoso das suas instalações e da sua sede, com lugar num
edifício que era propriedade da sua família, ali ao Lumiar, José Holtreman
Roquete sonhava agora com um grande team de Futebol. O descontentamento dos
jogadores da primeira categoria do Sport Lisboa entreabria-lhe uma porta que
não tardou em abrir às escâncaras. De uma assentada, traz para o Sporting oito
deles: José da Cruz Viegas, Emílio de Carvalho, Albano dos Santos, António Couto,
António Rosa Rodrigues, Cândido Rosa Rodrigues, Daniel Queirós dso Santos e
Henrique Costa.
Um autêntico terramoto! Deixem lá estas brincadeiras de
Jesus para lá e de Jesus para cá. Isto sim: foi tremendo! Tonitruante!!!
Parecia o fim da linha para o Sport Lisboa, até porque a
sangria não ficava por aqui. Manuel Mora, o guarda-redes, partiu para a
Argentina (um destes dias trataremos aqui a história interessante desta figura,
se tudo se encaminhar para tal); Fortunato Levy para Cabo Verde; outros optaram
por seguir a sua carreira no Ginásio Clube Português, no Grupo Sport Benfica,
no Cruz Quebrada, no Académico de Lisboa, no Nacional, etc.
Deserção? Dessedência? Traição?
Quem souber que responda. Mas com franqueza!
antiga Marcolino Bragança
A voz de Marcolino Bragança
Ao longo dos anos, este episódio da vida dos dois clubes foi
visto por diversos prismas. Um deles, o mais curioso, assumido por Cândido Rosa
Rodrigues, declarando que não se poderia falar em dissidência ou de traição até
porque não existia rivalidade entre Sport Lisboa e Sporting, e apenas entre
Sport Lisboa e Internacional, o velho CIF.
Temeu-se, assim pela vida do Sport Lisboa.
Ah! Como diria Mark Twain: «As notícias sobre essa morte
foram manifestamente exageradas».
Terminada a época do Futebol, entrava-se na época dos
desportos de Verão. Os protagonistas eram os mesmos. Isto é: jogador de Futebol
que se prezasse, chegando o calor, dedicava-se a desportos sem botas, fosse ele
a Natação, a Vela, o Ciclismo ou o Automobilismo.
E o sol parece ter auxiliado o olvido e cicatrizado feridas.
Era tempo para que se abrissem no azul claro do céu novos
horizontes rubros. Vozes se levantaram; peitos encheram-se de esperanças; o
mundo estava aí para os que usavam a gadanha da coragem.
Um belo dia, Marcolino Bragança, um dos melhores jogadores
das segundas categorias do clube, ainda jovem estudante do 4.º ano do Liceu,
lançou a ideia, tão óbvia que parecia pecado ninguém ter feito eco dela até aí:
- Ouçam lá, e por que é que não passamos o segundo team a
primeiro?
Era bem visto, sim senhor. Não houve quem se pusesse. Pelo
contrário.
Fez-se o apelo geral. Juntou-se a linha dura dos
resistentes: pouco menos de 30 rapazes empenhados em continuar com o clube.
Houve até quem regressasse: gente que tinha ido para o Cruz
Qubrada, o Sport Benfica, o Académico de Lisboa...
Os do Sporting não voltaram.
Félix Bermudes e Cosme Damião tomam as rédeas do clube que
ressurgia. Todos se dispuseram ao pagamento da quota de dois tostões por mês.
Félix Bermudes, escritor bem conhecido pelos seus poemas, peças de teatro e
operetas - como foi o caso da famosa «O Timpanas», curiosamente grande amigo e
tertuliano do bisavô deste que se assina, Acácio de Paiva -, um dos fundadores
da Sociedade Portuguesa de Autores à qual presidiu durante 32 anos, num gesto magnânimo,
ofereceu cinco mil réis para um boa nova.
Aqui sim, o Benfica, que ainda não era completamente
Benfica, começava a ver medrar as suas raízes populares. Bem ao contrário do
Sporting.
O tempo passou.
Houve lutas duras, combates violentos, jogos menos amigáveis
do que outros e até uma final da Taça de Portugal em que os adeptos do Sporting
fizeram parte da falange encarnada que bateu o FC Porto no Estádio Nacional.
Benfica-Sporting ou Sporting-Benfica: leiam como quiserem -
é como se fosse o eco de um poema...
antiga 1907 - segunda equipa Benfica
De cima para baixo. Da esquerda para a direita. Defesa e
guarda-redes: Henrique Teixeira, João Persónio e José Neto; Avançados: Félix
Bermudes (capitão), Eduardo Corga, Leopoldo Mocho, António Meireles e Carlos
França; Médios: Luís Vieira, Cosme Damião e Marcolino Bragança."
Afonso de Melo, in O Benfica