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“ A tua
ausência ainda pernoita……
nos escombros
de uma fotografia”
Al Berto
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Abri esta folha, olhei-a, à primeira vista, um branco
imaculado.
Gostaria de me envolver no exercício da escrita, com mais
propriedade do que a que, até aqui, estou a conseguir. Mesmo assim permito-me
insistir nesse propósito, por diversas vias, todas demasiado prosaicas, talvez.
Escrevo até à exaustão em blogues, um, dois? livros. Particularmente, sob a
batuta e mote da fotografia. Da fotografia de minha autoria. Essencialmente,
fotografia de reportagem, instantâneos do que vai ocorrendo nos momentos da
minha vida.
Agora que estou a entrar na segunda metade da minha
década dos sessenta, decidi-me a rever conceitos, formas, projectos de estudo,
ensaiando até poder. Ainda não perdi a esperança de que poderei vir a conseguir
escrever algo de novo, algo de útil e diferente, que resulte do trato natural e
espontâneo da minha imaginação e experiência de vida.
Imaginação, o que é a imaginação, em que é que se irá
materializar a minha imaginação ao ser transposta para letra de forma sobre
esta folha de papel que tenho aqui à minha frente? É verdade que ela já
encontrou o mote do momento, alguns versos de Al Berto. Quanta presunção!
De qualquer modo, ei-la que está a começar a aparecer com
uns salpicos gráficos. Mas para que servirá essa mancha assestada na claridade?
O dia está esplendoroso, ainda não são onze horas, da
janela que tenho em frente diviso uma paisagem vistosa, a Natureza em pleno
vigor, o rio Lis aqui perto a caminhar de mansinho, pelo vale, entre montes
sobranceiros, mal acabou de nascer. Lá vai ele ao encontro do Lena, na Barosa.
Ali se juntam, há quantos séculos não sabemos, há muitos, que não os
conseguimos contar, ninguém ainda conseguiu contar. Muitos já o cantaram e
continuam a cantar. Maravilhosamente. Bucolicamente. Romanticamente.
Leiria e o seu castelo e o seu rio trazem-me à ideia ausências
várias. A ausência do tempo em que não
senti a sua alma, ao mesmo tempo a ausência de terras de Viriato, da minha
ancestralidade, da minha juventude.
Poderei afirmar categoricamente que uma grande parte do
que me vai ocorrendo na vida está fixado em fotografia. Fotografia no sentido
literal do termo. Quantas fotografias não me olham com ares misteriosos, às
vezes desconfiados, outras como que a querer falar comigo, enquanto eu as olho
e ao olhá-las sou assaltado por sentimentos os mais dispersos, contraditórios
e, em muitos casos, a apelar intensamente a certas ausências, algumas de que mal me tenho
apercebido no nevoeiro infernal com que o tempo vai toldando o meu espírito.
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Ausência…
Pernoitar..
Escombros..
A ausência de um momento corporeamente registado numa
fotografia?
Já deteriorada pelo correr do tempo?
Essa ausência dorme…dorme…
Ainda é noite!
Até quando vai
continuar adormecida?
Não amanhece…a noite continua…
Deixemo-la dormir em paz!
Enquanto o tempo o permitir!
…
António Nunes
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