Autocrítica do poeta (*)
É tão fácil dizer que saem dos
olhos das mulheres andorinhas verdes
ou chamar à lua a caveira voada da
flâmula dum navio pirata!
Mas a outra poesia - onde está?
A poesia que transforma de repente
a música em lâmina
para romper a noite até à solidão
dos archotes
que escurecem mais e mais
este abismo absurdo
sem astros de céu vivo
onde as pedras apodrecem
e as andorinhas verdes não saem dos
olhos das mulheres?
Mas a outra poesia - onde está?
Esta esperança convicta
de teimar na certeza do nada
com explicações de papoilas
e esqueletos a abraçarem-se
no amor final já sem sentido de
bandeiras?
Sim. Onde está?
Que palavras abre
para além da luz secreta
que os dedos dos mortos acendem no
perfume das flores?
Sim. Onde estás?
- Poesia de rasgar pedras.
Poesia da solidão vencida.
Poesia das pombas assassinadas.
Poesia dos homens sem morte.
José Gomes Ferreira
Poesias III
Ed. Círculo de
Leitores - 1971
(*) No original:
(Crítica à poesia das imagens aos cachos.
8 comentários:
Faz falta a poesia de intervenção.
Muito bom , o texto.
Meu doce, estamos a oferecer flores a Leontien, (uma mocinha americana) que sofre de melanoma. Se quiseres participar basta colocar, no teu blog, um post com flores e vir aqui http://www.aruraljournal.com/p/flowers-for-leontien.html
Beijo
BShell
Meu Amigo,belo Poema que escolheu para este final de Abril.
Bom domingo.
Beijo.
isa.
eu gosto de José Gomes Ferreira, gosto da força das suas palavras.
gostei deste momento, aqui,
do excelente gosto musical e da escolha poética, gostei muito.
beijo.
Tão atual que podia ter sido escrito hoje.
E hoje o Sexta faz 5 anos.
Um abraço e uma boa semana
Vamos a Maio!
-
Que me importa
que o mundo não tenha sentido
se por aquela porta
entra o bafo comovido
desta luz macia
que em flores se gera.
Viva a anarquia
da primavera!
José Gomes Ferreira
Caro Nunes,
É sempre muito bom sabermos que ali em frente sempre poderemos encontrar um poeta até então para nós desconhecido.
Um abraço,
Pedro.
A poesia está na forma como pousamos o olhar e questionamos as coisas. Podem usar-se as palavras, as cores, os sons, as imagens...
Este blog é um exemplo...
Abraço.
Fazem falta outros poetas de um outro Abril!
Beijinhos poéticos!
Enviar um comentário